A EPIDEMIA DE CÓLERA

(In "Portugal Antigo e Moderno", de Pinho Leal, Vol 11)

Apesar da grande falta de arvoredo e de água, e da má vizinhança da lagoa e do cemitério, o clima de Foz Côa não é insalubre, por estar a Vila em sítio alto e muito lavado dos ares.

Na Hist. Eccl. de Lamego se lê textualmente o seguinte: «É Vila Nova mui saudável, sem obstar a intemperança do ar, por extremo frio de inverno, sem lenha, e no verão ardente com excesso, sem águas, frutas ou hortaliças, ainda que de tudo abunda por lhe vir cada dia de fora. Os naturais costumam chegar a velhice muito avançada; alguns passam de cem anos. Um existe em 1794 que militou na guerra da liga, e acompanhou o exército que entrou em Madrid. As queixas mais frequentes são reumatismos, paralisias, apoplexias, flatos hipocôndricos, carbúnculos, pleurises, e sezões perniciosas (?). Os estrangeiros que se vem aqui estabelecer têm pouca saúde e duração.»

O clima não é muito insalubre, mas aqui têm pesado com força várias epidemias, nomeadamente a cólera em 1855. 

Grassou desde março até o fim de agosto daquele ano, fez centenares de vítimas, não se podendo hoje saber ao certo o número, porque se não lavrou registo algum do obituário. O que se sabe é que foi uma mortandade medonha, sendo poucos os vivos para enterrarem os mortos!  

Dias houve em que os enterramentos foram feitos por mulheres, sem acompanhamento algum religioso, pois o pároco de então, Caetano Esteves de Matos, fugiu covardemente para a Vila de Trancoso. Morreriam todos os coléricos sem os socorros espirituais se não fora o intrépido sacerdote, hoje aqui abade, António Augusto de Almeida, que se tornou por essa ocasião benemérito, indo prontamente, com risco da própria vida, a toda a parte, noite e dia, ministrar os sacramentos aos empestados e distribuir-lhes palavras de conforto e socorros de toda a ordem.

Também muito honrosamente se distinguiu em tão negra conjuntura o digno administrador deste concelho, Fernando dos Santos Sequeira, que se conservou como um herói no seu posto, não se poupando aos maiores sacrifícios para valer aos seus administrados.

É o digno abade António Augusto d' Almeida irmão do rev. José Maria d'Almeida, distinto orador e digno abade também de Freixo de Numão, tendo sido anteriormente abade nas freguesias de Távora e de Santa Eulália de Arouca, nesta diocese de Lamego.


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