CIDADÃOS BENEMÉRITOS

(In "Portugal Antigo e Moderno", de Pinho Leal, Vol 11)

Mencionaremos ainda 3 beneméritos filhos de Foz Côa, nascidos no último século. São os seguintes:

1.°—José Joaquim Ferreira de Moura. Nasceu em 1776 e faleceu no dia 27 de junho de 1829, no sitio de Palhavã, freguesia de S. Sebastião da Pedreira, no patriarcado. Era filho de Bartolomeu Luiz Ferreira, farmacêutico, proprietário e sargento-mor de ordenanças, e de D. Margarida de Moura.  Formou-se em direito na Universidade de Coimbra, nos princípios deste século, e foi juiz de fora em Aldeia Galega do Ribatejo, tomando posse em 1804. Por ocasião da primeira invasão francesa o general Junot o incumbiu de trasladar para português o Código Napoleão, pelo que se tornou suspeito de jacobinismo e esteve alguns anos fora do quadro da magistratura, retirando-se para a sua terra natal, onde entretanto exerceu a advocacia. Consta que por esse tempo escrevera e publicara anónima uma interessante Alegação ou Memória jurídica em defesa de seu pai, que fora acusado de um crime gravíssimo, condenado nas instâncias inferiores e por último declarado inocente. 

Em 1820 já estava outra vez em exercício no quadro da magistratura, servindo o lugar de juiz de fora em Pinhel.

Liberal decidido, abraçou com entusiasmo as ideias políticas proclamadas no Porto em 24 de agosto de 1820, e em janeiro de 1821 tomou assento no congresso constituinte, como deputado eleito pela província da Beira.

Ligado intimamente a Manuel Fernandes Thomaz, foi com ele redactor do jornal O Independente, e tomou parte activa e muito saliente nos trabalhos daquelas cortes, em que foi membro e várias vezes presidente das comissões mais importantes. (1)

(1) Galeria dos deputados... pag. 238 a 258. e Revelações... por J. M. Xavier de Araujo, pag. 81. Nas câmaras distinguiu-se pelos seus vastos conhecimentos de ciências sociais, especialmente sobre o regime parlamentar francês.

A popularidade, de que se mostrara tão sequioso, não o abandonou, pois nas cortes imediatas de 1822 foi simultaneamente reeleito pelos círculos de Trancoso Coimbra, Castelo Branco e Aveiro. Em junho de 1823 emigrou para a Inglaterra e ali se conservou até 1826, data da proclamação da Carta Constitucional. Regressando ao seu país, dedicou-se novamente á profissão de advogado em Lisboa, até que uma pertinaz hidropisia o levou á sepultura em 1829. Além de varias obras anónimas, sabe-se que escreveu e publicou as seguintes: "Reflexões críticas sobre a administração da justiça em Inglaterra" . . . 2ª edição, Lisboa, 1836. 4.° de 180 pag.; "Abolição da Companhia do Alto Douro". .. Londres, 1826, — lª edição anónima. Da mesma obra se publicou 2. a edição póstuma, em Londres também, no ano de 1832. Supõe-se que foram escritas por ele também, mas publicadas sem nome de autor, as obras seguintes: "Dicionário de algibeira politico e moral" . . .Madrid (sem data) 12.° de 120 pag." O Catavento". . . Paris, 1826, 8.° gr. de 54 pág.;  "O Bota-fora do Catavento", ou a "Cabeça de bacalhau fresco", burleta em dois actos... Lisboa, 1827. Alguém lhe atribuiu também as Cartas Políticas de Americus.  Para as mais circunstâncias relativas a estas obras leia-se o Dicionário Bibliográfico de Inocêncio Francisco da Silva.

José Joaquim Ferreira de Moura casou com uma senhora muito ilustrada e de grande prestigio também, D. Maria Perpétua Lobo de Moura, e tiveram os filhos seguintes:

A. - João António Lobo de Moura, visconde de Moura, falecido em S. Petersburgo capital do império da Rússia, em 1868, onde era nosso embaixador, tendo ali casado com a condessa Anna Aproxina (?), hoje condessa de Moura, irmã da princesa Bolgrouski (?) esposa morganática do Czar Alexandre II.

B. - Eduardo Lobo de Moura, artista muito distinto, considerado o primeiro pintor caricaturista do mundo! . . .  Ainda hoje (1885) vive perto de Londres, contando cerca de 70 anos de idade.

C - D. Maria Bárbara Lobo de Moura. Casou com Júlio António de Luna e Vasconcelos, médico-cirúrgico pela escola do Porto, já falecido, e tiveram Júlio António Luna de Moura, cavalheiro de muito merecimento, bacharel formado em direito e advogado em Vila Nova de Foz Côa, onde reside e é presidente da câmara municipal.

D.—Augusto Lobo de Moura, falecido em Curitiba (?) no Brasil, onde era magistrado.

José Joaquim Ferreira de Moura teve vários irmãos. Para não fatigarmos os leitores, mencionaremos apenas um, João António Ferreira de Moura, que foi conselheiro de estado, deputado ás cortes, governador civil do Porto e de outros distritos, e 1º barão do Mogadouro. 

Faleceu no Porto e deixou uma única filha, D. Ana Isabel Maria de Moura Pegado e Oliveira, actual baronesa do Mogadouro, casada com o barão do mesmo título, António Saraiva d' Albuquerque e Vilhena, residentes na freguesia das Freixedas, concelho e comarca de Pinhel, tendo uma filha casada com seu primo, o dr. Júlio António de Luna e Moura, supra mencionado.

Dos três beneméritos filhos de Vila Nova de Foz Côa, nascidos nos fins do ultimo século, já mencionamos um, Joaquim Ferreira Soares de Moura; mencionemos agora os outros dois:

2.°- Joaquim José de Campos Abreu e Lemos. Nasceu nesta Vila em 1780 e, se não ocupou altos cargos públicos, teve uma vida interessante, cortada de peripécias; foi homem muito ilustrado e deixou de si boa memória. Provido por concurso em 1809 na cadeira de gramática latina da Vila de Freixo de Numão, hoje uma das freguesias deste concelho de Vila Nova de Foz Côa, deixou o dito emprego e o de escrivão da câmara da mesma Vila de Freixo para entrar na repartição do comissariado do exército, na qual serviu até o fim da campanha peninsular, merecendo ser condecorado com a medalha respectiva. Terminada a guerra, continuou ao serviço da mesma repartição, primeiramente em Elvas e depois em Lisboa, desempenhando diversas comissões tanto no tempo de paz, como no das guerras civis. Desde 1828 se alistou sob as bandeiras do sr. D. Miguel, cujo exército acompanhou até que a convenção de Évora Monte (26 de maio de 1834) o obrigou a regressar á sua casa de Freixo de Numão, onde permaneceu algum tempo, ocupando-se exclusivamente nos negócios domésticos. Instado por alguns amigos e pela falta de meios, abriu uma aula de gramática latina, primeiramente na freguesia d'Outeiro de Gatos (hoje concelho da Mêda), depois na Vila de Trancoso, e por último na do Fundão, leccionando em todas estas localidades numerosos discípulos que muito aproveitaram com as lições de tão sábio mestre. Exerceu no Fundão alguns cargos municipais, e em 1851 foi nomeado escrivão da  fazenda daquele concelho, cargo que parece ainda servia em 1857.

Ignoramos a data e a localidade do seu falecimento, mas sabemos que faleceu contando mais de 75 anos de idade e que escreveu e publicou as obras seguintes: "Gramática elementar da língua latina!... Lisboa, 1822, cuja edição foi de 1:500 exemplares e prontamente se esgotou; "O desagravo da Gramática"... Lisboa, 1820,publicação anónima; "Sustentação do desagravo da Gramática". . . Lisboa, 1822.

Para as outras circunstàncias destas obras, veja -se o Dicionário Bibliogr. de lnocêncio. 

3.° — Francisco António de Campos, 1º barão de Vila Nova de Foz Côa, comendador da ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, bacharel formado em direito pela Universidade de Coimbra, deputado às cortes de 1823, 1834 e 1835, ministro e secretário de estado dos negócios da fazenda em 1835, par do Reino etc. Nasceu nesta Vila em 1 de dezembro de 1780 (ignoramos a data do seu falecimento) e foram seus pais Luiz de Campos Henriques e D. Angelica Mendes da Silva. Deixou grande fortuna; foi homem muito ilustrado, e escreveu e publicou as obras seguintes: “Relatório do Ministro e secretário de Estado dos Negócios da Fazenda” . . . Lisboa, 1836; “A língua portuguesa é filha da latina”, Lisboa, 1843; publicação anónima; “Burro d'Ouro d'Apuleio”, traduzido em português, Lisboa, 1847, publicação anónima também.

São também seus vários artigos filológicos, publicados com a assinatura – Y - em vários números do jornal “O Pantologo”, a pag. 28, 46, 86, 103, 111, 120, 121, 146 e 171.

O barão de Vila Nova de Foz Côa faleceu sem sucessão, pelo que instituiu universais herdeiros da sua grande casa os seus dois sobrinhos seguintes:

—José Caetano de Campos e Joaquim de Campos Henriques, ambos conselheiros formados em direito, e magistrados distintos, juízes aposentados do supremo tribunal de justiça, ambos ainda vivos e residentes em Lisboa.

Para evitarmos repetições, veja-se o artigo Pinhel no vol. 7.°—nomeadamente a pagina 97, col.  (1)

(1)  O barão de Vila Nova de Foz Côa é hoje muito dignamente representado nesta Vila pelo seu 2.° sobrinho Eduardo de Campos Henriques, pessoa de muito merecimento e comendador da ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.

Esta nobre família Campos teve e não sabemos se tem ainda um ramo na freguesia de Freixo de Numão, deste concelho. Fez parte daquele ramo e parte muito distinta Manuel de Almeida Campos, natural daquela freguesia, médico-cirurgião pela Escola Medico Cirúrgica de Lisboa, casado cora D. Joana Maria Rosa de Campos, natural de Lisboa, onde viveu e teve um a filha, D. Maria José Augusta Campos de Gusmão. Casou esta senhora com Francisco António Rodrigues de Gusmão, bacharel formado em medicina pela Universidade de Coimbra, sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa, etc, um dos nossos  mais distintos escritores contemporâneos, natural de Tondela e já viúvo de D. Efigénia Victoria Balbina Pereira Pinto Maciel, natural de Faro.

Do seu primeiro consórcio não teve filhos o sr. dr. Francisco António Rodrigues de Gusmão, mas do 2º, teve os seguintes :

1.°—Francisco António Rodrigues de Gusmão Júnior, formado em filosofia pela Universidade de Coimbra;

2.°—Maria Francisca Campos de Gusmão;

3.°—Manuel de Almeida Campos de Gusmão;

4.°—D. Maria José Campos de Gusmão;

5.°—D. Maria Joaquina Campos de Gusmão.

O sr. dr. Francisco António Rodrigues de Gusmão (pai) nasceu na aldeia do Carvalhal, termo da Vila de Tondela, no dia 6 de janeiro de 1815. (Vd. Tondela no suplemento a este dicionário, onde completaremos a biographia de s. ex.a)

Entretanto pode consultar-se o Dicionario Bibliográfico de Inocêncio Francisco da Silva, que lhe dedicou um belo artigo e mencionou nada menos de 27 obras suas, publicadas até 1859.

 


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